O primeiro aspecto deste artigo é que lembrando Peter Drucker, “pai” da administração” em sua celebre frase tão citada neste momento de revalorização da gestão dos ativos intangíveis, “a cultura engole a estratégia no café da manhã”, nenhuma organização pode se dar o luxo de não gerenciar sua cultura.
Por isto, a Damicos Consultoria tem dado suporte a diversas organizações na construção e/ou aperfeiçoamento do seu modelo de gerenciamento e/ou monitoramento da sua cultura organizacional e com base nesta experiência acumulada em 28 anos de atuação, resolvemos socializar um pouco deste desafio rico, grandioso e estratégico que muitas organizações têm receio de enfrentar.
Para iniciarmos a reflexão sobre o modelo de gerenciamento ou de gestão da ideologia e cultura organizacional, três questões são fundamentais:
- O que é um modelo de gestão ou de gerenciamento?;
- O que é ideologia organizacional ou corporativa?; e
- O que é cultura organizacional?
O modelo de gestão ou de gerenciamento pode ser definido como o modus operandi de uma organização, programa e/ou projeto, ou seja, como ele deve ser gerenciado em todas as suas etapas, como funciona, quais são as suas diretrizes e/ou eixos de atuação.
O modelo de gerenciamento e/ou monitoramento da cultura de uma organização é a definição clara de como sua organização irá gerenciar a cultura na prática, definindo diretrizes, estruturas/atores, finalidades/responsabilidades de cada estrutura e/ou ator, como também a sua estratégia de operacionalização.
A ideologia organizacional ou corporativa é um registro simbólico que representa o posicionamento da sua organização frente a questões existenciais. É a identidade da sua organização, como você quer que ela seja percebida e se relacione. Desdobrando-a em temas focais como identidade, propósito, negócio, missão, valores e visão.
Quanto mais clara e disseminada for à ideologia da sua organização, maior será a garantia e segurança de que os pilares da sua empresa são claramente entendidos por todos, evitando-se, assim, discussões ideológicas e, certamente, otimizando seus ganhos em competitividade.
E cultura organizacional está intrinsecamente ligado à ideologia da sua organização, mas, vai muito além disto. A cultura de uma organização tem mais haver com decisões, práticas, comportamentos e atitudes dos sócios, dos fundadores, das lideranças e colaboradores no seu cotidiano, o que chamamos de cultura vigente, a cultura na prática. Uma cultura organizacional tem 3 (três) componentes. O primeiro deles são os pressupostos, que pode ser traduzido com o que os outros acreditam. O segundo componente são os valores compartilhados, que são os que os outros nos dizem. E por último, os artefatos, que é o que vemos.
Partindo destes pressupostos, ficam algumas questões:
- Até que ponto o não conhecimento da cultura vigente (cultura atual) impossibilita o gerenciamento de uma cultura organizacional?;
- Sem este conhecimento, será possível sistematizar as ações, as práticas de gestão, os projetos, de maneira integrada e sinérgica sob a mesma égide, ou seja, sob o “guarda-chuva” de um modelo de gerenciamento e monitoramento de uma cultura, que fortaleça os aspectos positivos desta cultura vigente?;
- Como podemos desenhar um modelo de gerenciamento da cultura organizacional, sem clareza e/ou sem a definição clara da cultura desejada (cultura mais adequada ao contexto daquela organização e do seu negócio e/ou atividade-fim)?; e
- O quanto este modelo de gerenciamento e monitoramento da cultura organizacional deve relacionar-se com o modelo de gestão da organização e com o seu planejamento estratégico?
Em relação à primeira e segunda questão a organização precisa mapear de forma mais sistematizada e concreta, a ideologia, cultura atual ou cultura vigente, pois, como se gerenciar ou monitorar ou até se faz algum tipo de intervenção naquilo que não se conhece.
Temos realizado pesquisas de identidade e propósito em alguns dos nossos projetos de consultoria e é impressionante como em alguns casos, mesmo sem a organização nunca ter trabalhado estes elementos (identidade e propósito), a um alto grau de clareza da identidade e propósito. Como há o contrário, organizações que estes elementos são bem definidos, mas, são elementos “mortos” na realidade organizacional.
Outro aspecto tem haver com a importância do uso de instrumentos quantitativos e qualitativos para mapear a cultura vigente, não podendo se abrir mão de coletar informações, leituras e sentimentos de todos os níveis hierárquicos.
Muitas vezes já nestas fases de identificação e/ou mapeamento da ideologia e cultura organizacional, já consegue se perceber alguns elementos da cultura desejada, ou seja, da cultura que precisa ser construída para uma melhor performance da organização.
Enquanto perdurar está falta de clareza da cultura vigente, a organização dificilmente poderá fazer algum tipo de intervenção, gerenciamento e/ou monitoramento da sua cultura organizacional. .
As perguntas ou comentários mais comuns que surgem são:
- “Não tenho clareza do nosso negócio, imagina da nossa identidade?”;
- “Está tão clara a nossa cultura organizacional, para que vamos fazer este mapeamento ou diagnóstico”; e
- “Não temos como gerenciar ou intervir em algo tão abstrato, como a ideologia e cultura organizacional“, entre outras expressões.
Em relação à segunda questão, cabe ainda destacar que acreditamos e recomendamos um trabalho primeiro focado na construção ou reconstrução da ideologia organizacional, que pode envolver workshops, pesquisas internas, entrevistas com lideranças e analise de elementos já existentes desta identidade.
Em alguns casos isto pode estar até atrelado à construção ou reavaliação do planejamento estratégico.
Além disto, nossa experiência mostra a grande diferença quando isto é construído de forma participativa e profissional, encarando-se como alguém que vai além de “belas palavras”.
Partindo-se desta primeira etapa de trabalho, aí sim cabe uma intervenção na cultura vigente, sempre com foco em potencializar, fortalecer os elementos positivos já existentes nesta cultura e minimizar os elementos negativos desta mesma cultura.
A própria ideia de construir e implantar um modelo de gerenciamento e monitoramento da cultura vai de encontro a uma ideia fantasiosa de mudança radical de uma cultura á curto ou até médio prazo.
Já quanto à terceira questão, também, não é possível desenhar um modelo de gestão e monitoramento da cultura organizacional, sem clareza e/ou sem a definição clara da cultura desejada (cultura mais adequada ao contexto daquela organização e do seu negócio e/ou atividade-fim).
É claro que podemos até construir o modelo, mas, não tem sentido gerenciar ou monitorar algo sem clareza do resultado desta ação, daquilo que queremos mudar pós-intervenção na cultura vigente.
Por exemplo, quero ampliar o foco em resultados na minha organização, ou será o trabalho em equipe? Quero minimizar a cultura burocrática e legalista, quero eliminar a complacência com condutas inadequadas?
Estas questões precisar estar respondidas, para que o modelo de gerenciamento da ideologia e cultura organizacional joguem á favor da caminhada para a construção e fortalecimento da cultura desejada.
Um dos primeiros aspectos a serem explorados inclusive na construção e implantação do modelo de gerenciamento e monitoramento da ideologia e cultura organizacional, refere-se à formação do comitê de gerenciamento da cultura. Quanto a isto, as dúvidas que surgem geralmente são:
- Quem deve formar este comitê?;
- Devemos convidar áreas e/ou pessoas?;
- Estas pessoas devem ser indicadas pela alta administração?;
- Qual o perfil destas pessoas?;
- Elas serão convocadas ou convidadas?;
- E quanto aos outros comitês de gestão (comitê de ética, comitê de comunicação, comitê da diversidade, etc.), o que faremos?
- Como a alta administração deve participar deste comitê?;
- Como evitar superposição e/ou sobreposição de ações do comitê de gerenciamento de cultura com as áreas que geralmente tratam destas questões (recursos humanos, comunicação, compliance, etc.);
- Este comitê necessitará de algum alinhamento conceitual ou capacitação? Isto deve ocorrer antes da sua formalização ou pode ser depois?; e
- A periodicidade de reuniões e os papéis deste comitê devem ser definidos formalmente?.
Se a empresa não entende a gestão da cultura como algo que permeia a gestão, ou seja, é transversal, ela não conseguirá formar o comitê da maneira adequada.
Este comitê poderá ter vida útil curta ou até não iniciar suas atividades, caso algumas pessoas-chaves da empresa sejam apenas convidadas e não convocadas, como por exemplo, gestor de recursos humanos, gestor da área de comunicação, entre outros.
Poderá, também, se perder uma grande oportunidade de fusão de alguns comitês, transformando-os em subgrupos do comitê de gerenciamento da cultura organizacional.
E a pior de todas as situações um comitê de gerenciamento da cultura organizacional que seus membros não têm clareza suficiente do que é gerenciar e monitorar a cultura de uma organização.
E por fim no que tange a última questão, o quanto este modelo de gerenciamento e monitoramento da cultura organizacional deve relacionar-se com o modelo de gestão da organização e com o seu planejamento estratégico?
O modelo de gestão da ideologia e cultura organizacional deve mais do que relacionar-se com o modelo de gestão da empresa, e sim, estar integrado a este modelo.
O que é muitas vezes traduzido através da concepção, implementação e avaliação do seu planejamento estratégico. E, quanto à gestão da cultura ela precisa estar inserida neste instrumento e por consequência na sua estratégia de negócios.
Desta forma, independente de muitas questões que precisam ser respondidas através de outros artigos, de pesquisas e/ou da vivência diária com o tema cultura organizacional, tentamos dividir através deste artigo algumas lições e questões práticas do modelo de gerenciamento da ideologia e cultura organizacional.
Fábio Rocha
Especialista em Carreira, Consultor em Sustentabilidade, Professor, Coach e Diretor-Executivo da Damicos Consultoria em Liderança e Sustentabilidade.
Maiza Neville
Especialista em Carreira, Consultor em Gestão de Pessoas por Competências, Professora, Coach e Diretora-Executiva da Damicos Consultoria em Liderança e Sustentabilidade.